"Feliz" dia da mulher: hoje eu quero voz

   Ontem não foi um bom dia para ter nascido mulher, hoje não é um bom dia para ter nascido mulher e amanhã também não será. O fato é: eu odeio ser mulher. Estou cansada de ser mulher. Eu não pedi para nascer sendo do sexo feminino, e eu nunca quis ter de destino tudo o que eu passo. Nascer mulher é uma luta diária e inglória.

   O julgamento conosco não é justo. Nossas roupas são julgadas, atitudes, palavras, tudo. É como se diariamente, sorrateiros, nos falassem que nossa vida não é digna, não é humana e não é nossa. A nós foi nos dado o direito ao silêncio, à passividade, à condescendência.

   Nesses últimos 3 anos 2015, 16 e 17 tive muitos momentos de depressão pura, mas também alguns de revolta. Briguei, fui grosseira, discuti por conta de comentários machistas dirigidos ou falados perto de mim. Fiz muitas inimizades. E, talvez, num maior número de vezes, resolvi adormecer, chorar escondida, fingir que não vi, me abster de pronunciar minhas opiniões. Me afastar de pessoas que não consideravam minhas dores ou as dores dos outros. Passei a evitar pessoas com pensamentos machistas perto de mim.

   Sempre que quis ter voz numa sociedade machista, o mundo me colocava no meu lugar: tu é revoltada, histérica, louca, imatura, "mimizenta". E o pior, muitas vezes ouvindo isso ser reproduzido por mulheres.

   Em 2017 eu apanhei (literalmente), e o pior, de outra mulher. Incentivada por outras mulheres, e como já era de se esperar, também por um covarde homem. Dentro de uma universidade. Levei socos, tapas na cara, puxões de cabelo e alguns chutes nas costas. tudo isso estando sentada, quieta, com as pernas escoradas em uma árvore e sem revidar nada (obviamente). 

  Aguentei homem semidesconhecido me agredindo verbalmente, colocando o dedo na minha cara e me violentando psicologicamente durante MESES na universidade. Aguentei gente me mandando coisas anonimamente, falando para eu me matar e defendendo o abusador psicológico em questão. Que até conta para si mesmo em rede social de relacionamentos (tinder) criou, fingindo que eu tinha feito um "fake" dele. Causando um linchamento virtual contra mim por puro egocentrismo.

   Em 2017 eu apanhei e ainda ouvi que poderia ter sido pior.  Eu sei que poderia ter sido pior. Sempre poderia ser pior. Se não é aqui, é na casa da vizinha, ou da conhecida que também tomou coragem para falar o que aconteceu.

   Quando me falaram que poderia ter sido pior, lembrei do caso da Eliza Samudio. Esquartejada, teve seu corpo entregue aos cachorros para sumir com ele. E o assassino em questão, ainda assim, virou ídolo.

   Quando me falaram que poderia ter sido pior, lembrei do caso da moça que foi trancada em um ônibus e violentada até ser dilacerada por dentro e morrer.

   Isso tudo me dá um nó no estômago, um nó nos cabelos e, às vezes, cortes nos pulsos. Coitada, foram "só" uns socos, uns tapas na cara, puxões de cabelo e alguns chutes nas costas. Assim como foi "só" um ácido na cara da modelo que levou isso por ciúme doentio da parte marido, né?

   As pessoas enxergam nas notícias um homem cara de pau pedir desculpa e ainda o aplaudem. Ele é capaz de seguir com a consciência tranquila de quem sabia que nem precisava pedir, porque pra sociedade, a culpa é sempre da mulher.

   Lembra aquele dia em que a pressionaram para assumir uma culpa que não era tua? Ou aquela vez que te chamaram de maluca aos berros? Ou aquele comentário negativo que fizeram sobre a tua aparência?

   Sempre sinto como se a minha dor não fosse válida, porque, por lei, ela não é. Fiz tudo o que estava ao meu alcance, e para minha "surpresa", não adiantou. 

   Ser mulher é sentir dor simplesmente por ter nascido o que é. É ter medo todos os dias. É não baixar a guarda nunca. É ser forte por ti e por quem não pode ser forte.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

escrevo porque preciso

protagonista